Em ano de demissões, aviso prévio e multa do FGTS são temas mais reclamados
Justiça do Trabalho em 2020 foi marcada por reclamações de ataques aos direitos trabalhistas
As chamadas verbas rescisórias — devidas pela empresa ao funcionário após seu desligamento — estão no topo do ranking como os temas que mais levaram trabalhadores à Justiça contra as empresas, em 2020.
De acordo com dados do Tribunal Superior do Trabalho (TST), sobre novos processos, o aviso prévio ocupa a primeira posição, seguido de multa de 40% sobre o FGTS e a multa por atraso no pagamento da indenização (confira a lista abaixo).
Um levantamento produzido pela consultoria Datalawyer Insights, a pedido do jornal EXTRA, revela que o volume total de processos ativos que tratam somente de aviso prévio e do pagamento da multa de 40% chega a 1,98 milhão, sendo que o valor total das causas ultrapassa R$ 138 bilhões. Já o valor médio de cada processo é de R$ 70.466.
Para especialistas, o atraso no pagamento no momento da demissão está relacionado à crise econômica agravada pela pandemia de Covid-19, e que tem levado muitas empresas a fecharem as portas:
“São verbas de natureza alimentar. A alta no número das ações está ligada ao desemprego e às demissões. Grande parte dos empresários não tem recursos para quitar estes compromissos após a demissão”, explica Ana Cristina Werneck, sócia do Gameleira Pelagio Fabião e Bassani.
Para Aline Fidelis, sócia trabalhista do Tauil & Chequer, no caso do aviso prévio, dúvidas sobre a indenização ajudam a explicar as queixas:
“Há falhas de interpretação que levam o empregador a fazer descontos. O empregado não vai trabalhar, vou descontar aviso prévio? E outras situações que geram dúvida”.
O aviso prévio de 30 dias (trabalhado ou indenizado) é garantido para o trabalhador que tiver até um ano de vínculo empregatício. Para quem tem um ano completo ou mais, além desses 30 dias, há mais três dias de salário para cada ano completo trabalhado, limitado a 20 anos.
Além disso, depois da demissão, a empresa tem até 10 dias para pagar as verbas rescisórias ao ex-funcionário. Entre elas, estão o saldo de salário; aviso prévio proporcional ao tempo de serviço; 13º proporcional; férias vencidas e proporcionais acrescidas de 1/3; a multa de 40% sobre o saldo de FGTS, além das horas extras devidas.
Desrespeito na pandemia
A expectativa é de que o aprofundamento da crise econômica e o crescimento das demissões em vários setores aumentem ainda mais o número de ações na Justiça do Trabalho.
Leandro Antunes, professor de Direito Trabalhista do Ibmec RJ e sócio da Antunes & Mota Mendonça Advogados, afirma que o desrespeito às leis trabalhistas foi intensificado na pandemia, em razão da crise econômica, mas é um problema que já vem ocorrendo há muito tempo. Ele acredita que as empresas deveriam se preparar melhor para esses momentos, criando uma reserva financeira destinada apenas a pagar as verbas rescisórias.
“Tem empregador que faz até mesmo o trabalhador assinar o recibo do pagamento, sem pagar as verbas devidas. A dificuldade financeira pode estar inflando esses números, mas não podemos esquecer que o empregador, quando coloca o negócio na rua, assume os riscos. Não podemos justificar a falta de pagamento por causa do cenário da pandemia”, diz.
Caso o trabalhador decida entrar na Justiça, Antunes lembra que o prazo para entrar com a ação é de até dois anos após a extinção do contrato de trabalho.
Setores mais afetados na crise
Entre os setores com o maior número de queixas, segundo a Datalawyer Insight, estão: administração pública, indústria da construção, atividades de vigilância e segurança privada, limpeza, e restaurantes e similares.
Daniel Santos, sócio trabalhista do escritório Machado Meyer, acredita que as medidas adotadas pelo governo federal em 2020 ajudaram a conter as demissões naquele ano, com a suspensão dos contratos de trabalho e redução da jornada. Em 2021, por outro lado, a situação da pandemia está pior e não existem os mecanismos jurídicos de proteção ao trabalhador:
“Muitas empresas vão continuar sofrendo com o fechamento do comércio e com a redução da atividade econômica. A gente precisa com muita urgência que o governo implemente uma medida similar à do ano passado”.
No entanto, enquanto isso não ocorre, ele aconselha que as empresas que precisaram demitir e têm dificuldades financeiras de arcar com as obrigações trabalhistas procurem os sindicatos das categorias para negociar acordos, como o parcelamento da rescisão sem pagamento de multa por atraso. Isso pode ser feito com mediação do Ministério Público do Trabalho.
Fonte: IG