O que esperar do Transporte Marítimo em 2025?
O ano começou com uma “excelente notícia” para o setor, quando os sindicatos representantes dos trabalhadores (ILA) e dos terminais portuários (USMX) da costa leste e do golfo dos EUA complementaram o acordo de reajuste salarial de 63% (ao longo dos próximos seis anos), iniciado após a paralisação de três dias ocorrida em outubro de 2024, com um compromisso dos terminais de reavaliar juntamente com os trabalhadores os planos de investimentos em automação das suas operações, visando evitar melhorias que possam culminar em perdas de posições de trabalho.
O apoio do então presidente eleito, Donald Trump, à pauta dos trabalhadores, foi determinante para o fechamento desse acordo, o que certamente evitou um desabastecimento do mercado nos EUA, e, principalmente, um verdadeiro nó na logística internacional – renomadas consultorias internacionais estimavam que cada dia de greve poderia gerar uma semana de backlog logístico.
Se por um lado esse acordo evitou uma nova explosão nos custos logísticos em todo o mundo, por outro lado os usuários dos portos dessa região (armadores e embarcadores) terão que conviver com custos operacionais mais elevados ao longo dos próximos seis anos, dado que esses terminais atualmente já não figuram no ranking dos mais eficientes do mundo e, pelos próximos anos, sequer poderão acompanhar a modernização observada em portos de outras regiões (notadamente na Ásia).
Outra “excelente notícia” já nos primeiros dias de 2025 foi o cessar fogo entre Israel e o Hamas, anunciado pelo então presidente Joe Biden dias antes de deixar a Casa Branca. Para além das vítimas fatais de ambos os lados e das questões humanitárias que envolvem esse conflito, fato é que, ato contínuo ao anúncio do cessar fogo, os rebeldes Houthis do Iêmen anunciaram que deixarão de atacar os navios comerciais que cruzarem no Mar Vermelho (exceto os de Israel), enquanto durar esse acordo. Os rebeldes inclusive libertaram a tripulação do navio RoRo Galaxy Leader que havia sido sequestrada no início desses ataques em novembro de 2023.
Esses ataques dos Houthis em apoio ao Hamas levaram os armadores a desviar seus enormes navios do Canal de Suez para o Cabo da Boa Esperança no sul da África em algumas das principais rotas do mundo (Ásia <> Europa e Ásia <> Costa Leste dos EUA), o que tem consumido cerca de 13% da capacidade mundial dos navios porta-contêineres, não apenas pelas viagens mais longas como também pelos congestionamentos gerados em alguns dos principais hub ports do mundo (tais como Cingapura), diante do aumento na quantidade de escalas de navios feeder que passaram a atender os portos da península arábica e do oeste do mediterrâneo outrora atendidos pelos grandes navios que passavam pela região.
A grande questão aqui é que importantes observadores internacionais, como a Eurasia Group e o próprio presidente Trump, acreditam que esse acordo não deve passar da fase 1 (troca de reféns e ajuda humanitária) e, com isso, os principais armadores vêm anunciando que continuarão evitando o Mar Vermelho.
Claro que um eventual retorno dos navios ao Canal de Suez poderia tirar pressão dos fretes, à medida que “devolveria” ao mercado os mencionados 13% da capacidade, contudo, vale lembrar que os armadores vêm “esticando” a vida útil de seus navios para atender aos picos de demanda observados desde a pandemia. Desse modo, atualmente, cerca 14% da frota mundial pode ser considerada como sucateável (navios com mais de 20 anos de idade).
Pontos Globais de atenção
Afora as questões geopolíticas, os congestionamentos nos principais portos do mundo (que rapidamente irradiam para outras regiões) e o provável sucateamento de navios, alguns outros fatores já conhecidos que podem influenciar o transporte marítimo global em 2025 são:
- Phase in/out das novas alianças entre armadores na rotas Leste-Oeste: o fim do 2M (MSC/Maersk) e o início da Gemini (Maersk/Hapag) e da Premier Alliance (One/Hyundai/YangMing) que ocorrerão a partir desse mês de fevereiro que demandará uma ampla reordenação na frota desses armadores, podendo gerar um misto de picos e vales nas principais rotas globais, que tendem a causar congestionamentos ao longo dos primeiros meses dessas novas alianças;
- Demanda Global: se por um lado o crescimento da oferta de capacidade para 2025 está dado (5,7%, ou um incremento de cerca de 2 milhões de TEU), ainda há uma série de incógnitas em relação à demanda: desaceleração da Europa, pausa na queda de juros nos EUA, ineficácia dos estímulos econômicos na China (que vem registrando um importante aumento em seu endividamento), novas sanções dos EUA à Rússia etc.;
- Des(Re)globalização: a ascensão de medidas protecionistas em muitos países (basicamente sustentada pelo empobrecimento da classe média, que viu seus empregos migrarem para a Ásia ou serem substituídos por máquinas e novas tecnologias), tem suscitado discussões e iniciativas como: Reshoring, Nearshoring e Friendshoring, que no limite podem levar a uma ampla reordenação nos fluxos internacionais de carga e, claro, redundância de navios;
- Fator Trump: apesar de já se saber que existe uma importante diferença entre o que o novo presidente dos EUA publica nas redes socias e o que ele efetivamente faz (vide as promessas de taxar produtos chineses em 60%, que agora já caíram para 10% e pode, até mesmo, se transformar na assinatura de um acordo bilateral entre as duas maiores potências mundiais), as tensões acerca da sobretaxação de produtos do México/Canadá, da “retomada” do Canal do Panamá, da anexação da Groenlândia, da deportação de imigrantes ilegais, da saída do acordo de Paris e da OMS entre outras, podem pressionar a inflação nos EUA e, consequentemente, no mundo;
- Descarbonização: Em abril a IMO deverá decidir as penalidades para navios que ultrapassarem as metas de emissão por tonelada/milha transportada, contudo muitos países já estão instituindo suas próprias tarifas de emissão de CO2. Dado que ainda não há um “combustível verde” com escala e capilaridade capaz de substituir os derivados de petróleo no tanque dos navios, as maneiras que os armadores terão de atender essas normas serão: redução da velocidade, aumento do tamanho dos navios, sucateamento de navios pequenos/ineficientes e repasse das tarifas aos embarcadores.
Pontos Locais de atenção
Nem só dos eventos globais se deram as dificuldades vividas por importadores e exportadores brasileiros em 2024. O esgotamento da capacidade de movimentação de contêineres nos principais portos brasileiros – que temos alertado desde 2019 – se tornou ainda mais evidente após os cancelamentos de escalas/viagens gerados pelo acidente com um navio na BTP (que fez o terminal operar com dois dos três berços por quase 8 meses) e a importante obra de modernização dos berços da Portonave (que fez o terminal deixar de operar até três navios simultaneamente para operar apenas um por vez).
A “boa notícia” para 2025 é que a BTP não apenas poderá operar com todos os berços, como também contará com dois novos guindastes (o que deve aumentar sua produtividade/capacidade) e que a retomada das operações em Itajaí poderá compensar parcialmente os efeitos da obra na Portonave, que só deve voltar a plena capacidade em 2026. Ainda assim, será importante estarmos atentos a:
- Forte crescimento da demanda: paradoxalmente, em se mantendo os excelentes níveis de crescimento de volume registrados em 2024 (cerca de 21% Impo e 13% Expo, conforme dados da Antaq), os portos brasileiros continuarão ainda mais pressionados;
- Navios continuarão crescendo: mais de 60% dos navios que transportam o comércio exterior brasileiro já enfrentam algum tipo restrição para operar a plena capacidade nos principais portos brasileiros, tendo de repassar aos fretes os custos dessa ineficiência. O ponto é que os navios continuarão crescendo de tamanho em busca de economia de escala e redução de emissões de CO2;
- Projeto de Lei da Modernização do Portos: Após o recesso parlamentar o Congresso deve retomar as discussões/votação desse projeto que vem sendo alvo de críticas dos sindicatos de trabalhadores que, inclusive, já ensaiaram algumas paralisações no final de 2024;
- Eventos climáticos: Mesmo que não ocorram eventos climáticos extremos como as tragédias vividas ano passado no Rio Grande do Sul e em Manaus, sobretudo com o fim do El Niño e início do La Niña, tendo em vista que muitos portos brasileiros estão operando no limite da capacidade, qualquer fechamento de barra por mau tempo pode gerar transtornos outrora rapidamente contornados;
Em suma, tudo pode acontecer em 2025 e, portanto, o momento exige um verdadeiro planejamento logístico com a antecipação de planos de contingência para muitos possíveis cenários, visando garantir que eventuais intercorrências sejam superadas.
Para tanto, clientes e fornecedores deveriam funcionar em perfeita sintonia, com transparência, previsibilidade (contratos mais longos e com gatilhos justos para ambas as partes) e, sobretudo, flexibilidade para se antecipar às rápidas mudanças observadas nos últimos anos. “Leilões de Frete” e “Bookings Fantasmas” tendem a tumultuar ainda mais!
Fonte: Portos e Navios