Renovação de ferrovias com a Vale abre guerra judicial entre estados e União

Renovação de ferrovias com a Vale abre guerra judicial entre estados e União

Os governos do Espírito Santo e do Pará prometem travar uma guerra judicial com o Palácio do Planalto para garantir a realização de obras ferroviárias com os recursos da renovação antecipada de contratos de concessão que vencem na próxima década. O governo federal decidira antecipar a renovação para cumprir a promessa do presidente Michel Temer de realizar obras estratégicas em seu mandato. O governo vai abrir mão de outorgas e permitir a renovação de contratos por 35 anos. Em troca, as empresas terão de construir ferrovias consideradas prioritárias, que serão posteriormente licitadas pelo governo.

A mudança foi anunciada em reunião do Programa de Parcerias de Investimentos. De acordo com o plano, a Vale, por exemplo, teria de construir uma ferrovia ligando Água Boa (MT) a Campinorte (GO), obra estimada em R$ 4 bilhões. Os governadores dos estados onde a empresa tem concessões ficaram insatisfeitos com a notícia.

DEMANDA DE ESTUDOS TÉCNICOS

Os governadores Paulo Hartung (ES) e Simão Jatene (PA) se reuniram na terça-feira em Vitória para enviar uma carta a Temer pedindo a suspensão dos processos de renovação das concessões ferroviárias. Eles argumentam ser ilegal e injusto que a contrapartida pela prorrogação da concessão das ferrovias Carajás e Vitória-Minas vá para o Centro-Oeste. Cada estado vai entrar com ação própria na Justiça Federal contra a União.

Na carta enviada a Temer, Hartung e Jatene afirmam que a “prorrogação antecipada cogitada somente será justa, sob a ótica da sustentabilidade e do desenvolvimento regional, se os novos investimentos exigidos pela lei 13.448/2017 forem destinados para a ampliação das malhas ferroviárias nos estados diretamente relacionados com as concessões.” Eles também cobram estudos técnicos prévios que fundamentem a vantagem da prorrogação do contrato sem licitação, consulta pública nas regiões interessadas e aprovação do Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo os governadores, a falta de dados técnicos poderá causar prejuízos financeiros ao Brasil.

No caso do Pará, a contrapartida que melhor atende ao estado é o investimento na Ferrovia Paraense. Os governadores argumentam que esta permitiria escoar a produção do agronegócio do Centro-Oeste. Já para o estado do Espírito Santo a melhor opção seria ampliar a malha da Ferrovia Vitória-Minas.

“A ampliação da malha propiciará a integração de mercados maduros de cargas aos portos de alta capacidade localizados no Espírito Santo e Rio de Janeiro, mercados que não crescem por falta de infraestrutura e capacidade logística”, afirmaram os governadores na carta.

Segundo Hartung, “não faz sentido uma antecipação de concessão feita às pressas, sem critério, sem um bom debate”. Jatene classificou a decisão do governo federal de “atabalhoada”.

– Contratos de concessão são fechados em âmbito federal. O que entraria no novo contrato com a Vale são as novas obrigações das partes na concessão (como a isenção de pagamento de outorgas e a construção de uma ferrovia). Se a Vale tiver assinado contratos se comprometendo com investimento em projetos locais, ela não fica isenta deles. Mas isso não estaria no escopo da concessão – afirma o economista Claudio Frischtak, à frente da Inter.B Consultoria.

‘INSEGURANÇA JURÍDICA’

Ele vê, no entanto, dois fatores de instabilidade:

– Em termos econômicos, falta uma boa análise de onde estão os maiores retornos para a sociedade. Os projetos defendidos por Espírito Santo e Pará podem ser importantes. Mas não sabemos se são os melhores. Por outro lado, isso pode agravar a insegurança jurídica no país.

Maurício Lima, sócio-diretor do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos), considera o modelo proposto pelo governo acertado. Mas avalia que o processo está sendo conduzido sem cuidado, o que pode trazer problemas.

– São projetos muito aquém da necessidade do Brasil, falta mensurar impacto e benefício.

Em nota, a Vale informou que está acompanhando o debate sobre concessões. “Cabe à empresa, como concessionária, fazer o que for definido pelo governo federal. É importante ressaltar que a aprovação para a prorrogação antecipada das concessões será submetida ao Conselho de Administração da empresa”.

Fonte: O Globo